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JAMB - MAI/JUN/JUL - 2006
Saúde não é moeda
de negociação política
No mês de maio, o Ministério da Saú-
de trouxe mais uma péssima notícia para
a população brasileira. Três anos após
constituir uma comissão para elaborar
uma proposta de política nacional de
medicina natural e práticas complemen-
tares para o Sistema Único de Saúde
(SUS), deu força de lei a uma normativa
completamente desfigurada, prejudicial
a todos, trazendo enormes riscos à
população.
A análise da Portaria 971 passa,
necessariamente, por algumas varian-
tes. Entre a série de graves falhas, abre
a possibilidade de que a acupuntura e a
homeopatia sejam praticadas por
profissionais de saúde diversos
(ou multiprofissionais) inseridos no
SUS, sem estabelecer claramente que o
diagnóstico clínico deve ser, obrigato-
riamente, ato privativo dos médicos.
Ela também tenta legitimar alternativas
sem qualquer comprovação científica.
Temos de considerar que a acupun-
tura e a homeopatia, se praticadas por
médicos, trarão inegável benefício ao
usuário. Essas especialidades médicas
realmente merecem atenção do Ministé-
rio da Saúde e sua abrangente inserção
no SUS é plenamente compreensível.
É irresponsabilidade não levar em
conta que elas devem ser exercidas por
profissionais com o devido treinamento
e competência, com a formação adequada
para diagnosticar doenças e tratar
pacientes, ou seja, por médicos.
A aplicação de ambas tem fins diag-
nósticos e terapêuticos. Se dá em doen-
tes, exigindo, conseqüentemente, forma-
ção médica, fator relevante que a Portaria
simplesmente ignorou.Aliás, até no nome
do recém-criado programa a medicina foi
alijada. A Portaria se refere à “Política
Nacional de Práticas Integrativas
e Complementares”.
Existe uma preocupação dos
médicos, e de suas entidades
representativas, como a Asso-
ciação Médica Brasileira
(AMB), em reavaliar constantemente os
procedimentos e terapêuticas, substi-
tuindo-os por outros de maior eficácia e
com menor possibilidade de efeitos
adversos. Isso justifica a retirada de
recursos obsoletos da prática clínica e a
incorporação de outros mais modernos
e eficientes.
Faz anos que a AMB e o Conselho
Federal de Medicina trabalham exausti-
vamente num rol de procedimentos,
batizado de Classificação Brasileira
Hierarquizada de Procedimentos Médi-
cos, com o objetivo de informar e
disponibilizar aos cidadãos a integra-
lidade da medicina moderna. A elabora-
ção dessa lista segue parâmetros técni-
cos e científicos. São critérios como
estes que deveriam nortear decisões
públicas que mexem com a saúde da
população, como a Portaria 971. Aliás,
isso deveria ser regra tanto para a área
pública quanto para o segmento privado.
As políticas de saúde não podem,
sob hipótese alguma, passar por nego-
ciações políticas nemmerecer tratamento
meramente econômico. Se não houver
critérios técnico-científicos, jamais se
consolidará um Sistema Único de Saúde
integral e de qualidade, conforme
estabelece a Constituição Federal. Em
nome da segurança dos cidadãos, cabe
ao Ministério da Saúde fazer urgente-
mente uma rigorosa autocrítica e revisar
imediatamente a Portaria 971.
e d i t o r i a l
José Luiz G. do Amaral
Presidente da AMB