Quais os principais problemas enfrentados
pela obstetrícia no país hoje?
No momento, estando a categoria médica elencada como au-
tora e protagonista de todas as desditas da saúde no Brasil, e a
incompetência e inépcia da gestão estando escamoteadas e as-
sociadas às enormes dificuldades de financiamento, às percep-
ções distorcidas das assimetrias e às vulnerabilidades do nos-
so país continental, entendo que a obstetrícia é uma das áreas
mais atingidas da medicina. Não é compreensível ser propa-
gandeado que existe uma violência no parto e que ela seja exer-
cida pelo obstetra. A humanidade teve ganho exponencial em
longevidade e em qualidade de vida e saúde graças aos avan-
ços da medicina. Dentre eles, o parto assistido com melhores
cuidados. E, dentre esses cuidados, a incorporação de inter-
venções necessárias e salvadoras. Não me parece razoável, no
caso de haver o esgarçamento do períneo no período expulsi-
vo, que não possa ser realizada uma episiotomia, nem que, ha-
vendo riscos em um parto transpélvico, não possa ser indica-
da a intervenção cirúrgica. Exageros devem ser entendidos e
discutidos como exageros, e não como violência de uma cate-
goria profissional. Não entendo a quem possa interessar levar
ao descrédito profissionais que, na maioria, são competentes,
responsáveis e sensíveis ao sofrimento. Se ocorreram violên-
cias contra a parturiente, será que são exclusivas dos médicos?
Deve-se observar mulheres sendo atendidas em macas – ou
no chão – em “hospitais”; não haver instância de alívio da dor
– lembrar que sensação de dor é uma percepção individual –;
não haver vagas para internações. Será que não ocorrem ce-
sarianas porque médicos se sensibilizam com a dor e também
porque são pressionados pelos familiares penalizados pelo so-
frimento? Por que, muitas vezes, não é possível ser realizada
anestesia no parto transpélvico?
Creio que o maior problema que os obstetras e a Febrasgo se
defrontam é com a campanha de descrédito, que parece aten-
der a ideologizações, e não a uma realidade; que tangencia os
riscos que os médicos não aceitam, e passam a ser divulgados
como uma invasão do direito ou da autonomia não respeita-
da. O compromisso original hipocrático é o da beneficência,
e não o da maleficência. Autonomia e justiça foram incluí-
das nos tempos modernos. Mas autonomia exercida no limi-
te aproxima-se de abismos como o infanticídio. Quando po-
sições legítimas são discutidas – no caso, desejos e direitos
das mulheres
versus
a aplicação do aprendizado dos médicos,
que procuram e oferecem caminhos de menores riscos e que
também têm o direito de não acatarem todos os desejos dos
pacientes – sob pontos de vista ideologizados, o mais prová-
vel é o afastamento das soluções reais. Ambos estão certos,
mas o ponto de encontro que ampara os atores envolvidos se
torna nebuloso e é origem de conflitos. O ideal é procurar a
solução que traga os melhores resultados.
A qualificação do programa de residência em
ginecologia e obstetrícia é satisfatória?
O conteúdo programático existente, que foi proposto para
ser executado em locais que disponibilizam a residência,
atende ao mínimo necessário para que o médico seja con-
siderado apto para exercer a especialidade. O programa é
satisfatório dentro do contexto brasileiro. A execução e
aplicabilidade do programa se efetua razoavelmente nos
grandes centros de ensino – acadêmicos e hospitais de ex-
celência –, mas, infelizmente, eles são em menor número
que aqueles com estruturação deficiente.
Como você pretende atrair recém-
-formados para a FEBRASGO?
O caminho é espinhoso, dif ícil. Há diminuição de interes-
se dos médicos recém-formados pela pós-graduação – re-
sidência médica – em ginecologia e obstetrícia (GO). A
partir do início da gestão atual, a Febrasgo estimulou, den-
tro das faculdades de medicina e junto aos diretórios aca-
dêmicos, a organização dos estudantes interessados em
GO em vínculo associativo. A ação foi produtiva e, no fim
de 2012, foi fundada a Associação Nacional de Estudan-
tes de Medicina com Interesse em GO. A Febrasgo deu e
dá apoio à Associação, principalmente atendendo às ne-
cessidades dos estudantes associados em conteúdos espe-
cializados, e incluindo-os nos congressos brasileiros da Fe-
brasgo.
As lutas enfrentadas pela Febrasgo, nos locais em que a
Federação tem “assentos”, em benef ício da especialida-
de, é outra estratégia de cooptação dos recém-formados
e também de GO não associados. Tornando-se uma es-
pecialidade mais bem vista, mais valorizada e mais bem
remunerada, a esperança é que o quadro associativo au-
mente.
Os valores dos principais procedimentos
da especialidade pagos atualmente
contemplam os anseios da categoria?
Não contemplam. O problema é quase geral da categoria
médica. Os procedimentos não foram atualizados duran-
te os últimos anos. Para a GO, a defasagem de pagamentos
levou à luta persistente para que obstetras possam e sejam
pagos pela sua disponibilidade.
Acredito que o enfrentamento pela melhoria da remunera-
ção deva ser efetuado por toda a categoria médica e por to-
das as especialidades em uníssono, pois há o risco de que
algumas especialidades, em momentos de maior facilita-
ção, seja por grande carência de especialistas ou por terem
algum grupo de maior influência, venham a ser beneficia-
das em detrimento de outras.
■
maio/junho
2014 •
JAMB
•
5