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Editorial
Temos hoje aprovado, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 3466 de 2004.
Dentro dos limites éticos próprios da medicina e dos médicos, perseverando com competência,
mas, sobretudo, conscientes da justeza de suas propostas, logramos os médicos convencer
nossos parlamentares.
Vê-se enfim reconhecida a necessidade de tomar em consideração a lista referencial de
procedimentos médicos que estabeleça nesta área os limites da integralidade na assistência à
saúde.
A Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (CBHPM) veio da necessidade
de estruturar um processo permanente de reavaliação técnica da prática clínica; de manter atual
uma lista de procedimentos, escoimada de novidades sem substância e obsolescências
injustificáveis à luz das melhores evidências científicas. Igualmente necessário era hierarquizar os
itens constantes da lista, sorte a construir base sólida para valorização do ato médico. A CBHPM
exprime a integralidade da assistência médica, a ser defendida como padrão de qualidade
assistencial, a ser buscada como ideal, no privado como no público. A integralidade da assistência
não é a lista de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS), ou o rol elaborado pela Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS), esses fortemente influenciados pela capacidade
operacional ou financeira de se oferecer às populações cobertas as alternativas consideradas.
Limitar-se-iam as doenças às cláusulas dos contratos dos planos de saúde? Teriam tais contratos
poder suficiente para deter mutações que tornem homens eventualmente mais frágeis e
microrganismos mais agressivos? Teriam eles poder de condicionar comportamentos? Seriam
eles capazes de deter o progressivo envelhecimento das populações? Conseguiriam eles anular o
progresso científico e esconder a efetividade de novas alternativas diagnósticas e terapêuticas?
As transformações constantes da prática clínica fazem obsoletos os contratos e obrigam sua
constante revisão.
A distância entre a CBHPM e as listas do SUS e da ANS representa o caminho a percorrer no campo
da atenção médica. E sempre que nos dispusermos a reconhecer os limites da realidade e
trabalhar na sua transformação na direção do ideal, trilharemos o bom caminho.
O Projeto de Lei 3466/04 foi umgrande passo no bom caminho.
Com ele admite-se que, em função da exigüidade de recursos hoje disponíveis, há distâncias a
vencer. Distâncias conhecidas por quem sinceramente se atreve corajosamente a superá-las.
Distâncias impostas pelo avanço da ciência, novas doenças, mudanças no comportamento de
doenças antigas, redistribuição da prevalência de condições mórbidas, sobretudo condicionadas
por profundas transformações nas condições de vida dos integrantes de nossa sociedade. M a s
como vencer os obstáculos que separam tantos milhões de seres humanos dos benefícios do
progresso?
Não será certamente negando a existência de novas alternativas, mas dimensionando com
precisão recursos financeiros, definindo prioridades, estabelecendo metas, admitindo sempre as
distâncias entre o atual, o circunstancialmente possível e, sobretudo, o ideal, sem jamais deixar de
reconhecê-lo ou perder o equilíbrio na avaliação das possibilidades.
Os parlamentares fizeram seu trabalho. A sociedade lhes será reconhecida. Cabe-nos,
aos médicos, aos gestores públicos e privados viabilizar este ideal comum. Não
nos faltará, da sociedade, a confiança e o apoio.
A CBHPM seria um caminho longo e difícil, bem o sabíamos antes de
iniciá-lo. A isso estamos habituados. A própria Medicina, “ars longa”,
tambémo sabíamos ser, quando a encolhemos como o nosso caminho.
Março | Abril 2007
Jornal da
Projeto de Lei
3466/2004