Background Image
Table of Contents Table of Contents
Previous Page  5 / 25 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 5 / 25 Next Page
Page Background

5

JAMB - JAN/FEV - 2007

criadas comissões intra-hospitalares

responsáveis por tomar conhecimento

do potencial doador, mantê-lo em con-

dições adequadas, notificar a central e

abordar as famílias. O número de trans-

plantes cresce 10% ao ano e, com o

envolvimento de cada vez mais pesso-

as, tende a dobrar ou triplicar nos

próximos seis anos.

Quais são os tipos de transplante

mais realizados no Brasil e suas taxas

de sucesso?

Medina –

O mais realizado é o de

córnea, com quase 100% de sucesso.

Na seqüência, o de rim e o de fígado,

com 90%. O de coração tem 80%, pân-

creas 70% a 80% e pulmão cerca de 50%

a 60%, em média. As chances variam

bastante de acordo com a condição

clínica do paciente. Os resultados são

melhores na faixa etária da adoles-

cência aos 45 anos.

Qual o critério mais adequado

para as filas?

Medina –

Seguindo a ordem crono-

lógica, são transplantadas as pessoas

que têm mais chance de sucesso. Uti-

lizando apenas a condição clínica, são

privilegiados os pacientes mais doen-

tes, cujos resultados não serão tão

bons. No Brasil, a sociedade decidiu

pela fila de espera por ordem de pedi-

do para o transplante de rim. Para o de

fígado, o critério é o estado clínico,

também por ser mais fácil identificar

os casos mais graves, enquanto os pa-

cientes em diálise estão em condições

muito próximas. Isso também ocorre

com o coração, cujos doentes geral-

mente têm expectativa de vida de um

ano antes do transplante, portanto

todos têm igual urgência.

Quem estabelece esses critérios?

Medina –

São todos muito bem

estudados por profissionais da área em

comissões criadas pelo Ministério da

Saúde. Isso tem sido feito de maneira

muito democrática no Brasil.

Comoéa imagemdo transplantebra-

sileiro no cenário internacional?

Medina –

Extremamente positiva.

Somos o segundo país do mundo em

número de transplantes. A Unifesp é o

maior centro de transplantes renais do

mundo. Os mais de mil transplantadores

brasileiros têm contribuído muito para

a formação desses especialistas dentro

e fora do País e também para o entendi-

mento da resposta imune, das causas

da rejeição e dos procedimentos para

inibi-la.

Porquequantomaisqualificadoo sis-

tema de saúde de um País, maiores são

as filas de transplante?

Medina –

À medida que a sociedade

se organiza, as pessoas passam a viver

mais e aumenta a necessidade de

transplantes. Quanto mais idoso, maior

a possibilidade de falência de um único

órgão. Por outro lado, menor é a chance

de uma pessoa morrer precocemente,

pois há menos acidentes de trânsito e

menos violência urbana, diminuindo o

número de doadores.

Ea solução seriamas células-tronco?

Medina –

O caminho é a criação

de órgãos em laboratório a partir de uma

célula-tronco ou ainda não totalmente

diferenciada. O desafio é formar o órgão

inteiro a partir de um botão embrionário.

Acredito que, no futuro, será possível

substituir um órgão doente por outro

fabricado em laboratório a partir de uma

célula humana ou até de uma célula de

uma outra espécie, que apresente pouca

rejeição.

Emquanto tempo issoserárealidade?

Medina –

De uma maneira pessimis-

ta, prevejo em 40 anos. É um processo

bastante complexo, mas já há várias

linhas de pesquisa nesta área com

algum resultado. Pode ser que ocorra

antes, em 20 anos.

Quais órgãos a pessoa pode doar em

vida?

Medina –

Com muita segurança, o

rim. Em condições excepcionais, é pos-

sível doar uma parte do fígado ou do

pulmão, mas em geral são doações de

pai ou mãe para filho, porque envolvem

mais risco. Sempre preferimos um doa-

dor cadáver, mas não é antiético fazer o

transplante com doador vivo quando há

uma grande relação afetiva. Fora da

família, evitamos, para que não haja

qualquer irregularidade.

As pessoas, emgeral, ainda têmmedo

de doar órgãos?

Medina –

De 70% a 80% das pesso-

as autorizam que a doação ocorra depois

de sua morte. Os demais não querem que

o corpo seja alterado. É uma questão in-

trínseca e respeitamos a visão de cada

um. Pessoalmente, sou doador de todos

os órgãos. Entendo que posso continu-

ar colaborando para a qualidade de vida

de outras pessoas. Sei que isso não me

fará falta. Se algo sobreviver, será a alma.

Cada vez mais as pessoas estão enten-

dendo assim.

Não tocar no assunto coma família é

freqüente?

Medina –

Essa é a principal

recomendação que fazemos. Para ser

doador, não é necessário qualquer

documento, basta avisar a família, que

vai autorizar a doação. Na maior parte

das vezes em que a família nega, o

argumento é de que não conhecia a

vontade de quem faleceu.

Quais são os enfoques das campa-

nhas de conscientização?

Medina –

Até aqui o enfoque tinha

sido a população leiga, mas agora

estamos nos dirigindo mais aos médi-

cos, para que notifiquem as centrais

sempre que houver um potencial doa-

dor. Se cada médico notificar um doa-

dor por ano, o número de transplantes

avançará muito. Todos os hospitais

têm o número da Secretaria Estadual

de Saúde pelo qual é possível fazer a

notificação por telefone mesmo,

imediatamente.

Existe tráfico de órgãos no Brasil?

E em outros países?

Medina –

No Brasil, não existe. A

pena prevista em lei é de três a oito

anos de prisão. Os profissionais

sempre sabem a origem dos órgãos a

serem utilizados. É tudo informatizado

e o Ministério Público acompanha de

perto. Na China, são vendidos órgãos

de prisioneiros condenados à morte.

No Irã, o governo estabeleceu remu-

neração para quem doa um órgão em

vida. Há venda de rins na Índia diante

da falta de diálise para todos os

pacientes. Não consideramos ética

nenhuma dessas situações.