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NOVEMBRO/DEZEMBRO 2009
entrevista
1) Como começou esse
movimento?
Dennis -
Em 2008, três grandes unida-
des pediátricas encerraram o atendi-
mento alegando que iriam se dedicar
às áreas mais nobres como UTIs pediá-
tricas e neonatais, oncologia e quimio-
terapia, etc. A verdade é mais comple-
xa. Fecharam pois os pediatras, por não
mais aceitarem o valor aviltante pago
pelos planos de saúde pelas consultas
pediátricas, decidiram buscar outras
formas de remuneração. Os gestores,
então, para justificar a falta de aten-
dimento, deram declarações à mídia,
informando que a medicina brasileira
não forma mais pediatras, o que obvia-
mente não é a realidade. O que falta
é respeito pelo profissional, melhor
remuneração, valorização de seu traba-
lho, diálogo, estímulo ao trabalho.
Assim, os serviços não tiveram como
fechar escalas de plantão, por falta de
recursos humanos.
2) Isso provocou aumento da
demanda em outras unidades...
Dennis -
Sem dúvida. Em março, a
média de espera de uma criança no
pronto-socorro privado era de 4 a 5
horas, muito mais do que no pronto-
socorro público. Um determinado dia,
procuradores da justiça que estavam
na fila de espera se sentiram ultraja-
dos e fizeram reclamação a direção do
Hospital. O assunto foi para a impren-
sa, que resolveu investigar. As admi-
nistrações hospitalares e os planos de
saúde, para se defenderem, delegaram
a culpa à falta de profissionais, o que
Dennis Alexander,
presidente da Sociedade brasileira
de Pediatria do Distrito Federal
Após seis meses de negociação, ameaças e boicotes,
os pediatras da rede privada do Distrito Federal
romperam os contratos com planos de saúde.
Intermediados pela SBPDF, a categoria conseguiu
expressiva vitória.
Foto: César Teixeira
é uma inverdade, já que no DF temos
53 pediatras para cada grupo de 100
mil habitantes, enquanto que a OMS
preconiza 17 para 100 mil. Na verda-
de, não faltam pediatras, falta remu-
neração, planejamento estratégico
de fixação de mão-de-obra. Com as
inverdades publicadas, a Sociedade de
Pediatria do Distrito Federal saiu em
defesa dos pediatras. Procurou a mídia
para esclarecer os fatos e os planos para
uma negociação, já que nessa ocasião
a consulta pediátrica era remunera-
da entre R$ 20,00 e R$ 42,00 brutos
e depois, descontados os impostos e
taxas, chegavam a mão do pediatra
de R$ 14,00 a R$ 28,00 líquidos, ainda
assim com três ou quatro meses de
atraso.
3) Como foi a negociação?
Dennis -
Em março, fizemos o primei-
ro contato com empresas de plano de
saúde. Apresentamos uma pauta de
reivindicação enxuta e não recebe-
mos nenhuma resposta. Essa pauta era
composta de um valor de consulta de
pronto-socorro de R$ 100,00, já pago
por um plano de saúde, o SIS, que foi
tomado como parâmetro a ser nego-
ciado. Na pauta de negociação ainda
constavam: pagamento de consultas
sem carência de tempo, chamadas
pelas empresas de retorno, as quais são
sistematicamente glosadas; pagamen-
to de visitas hospitalares ao pacien-
te internado; reajuste automático e
periódico pelos índices de mercado,
já que nunca foram cumpridos, pois
os valores remontam a 2002. O quin-
to item definia que todos os valores
praticados pelas empresas de planos e
seguro-saúde deveriam ser uniformes
para todos os médicos, já que algumas
queriam negociação individual com
valores diferentes a cada médico.
4) E o resultado, foi satisfatório?
Dennis –
Tivemos no dia 1º de julho um
dia de paralisação no atendimento aos
planos de saúde, como uma forma de
alerta às empresas. Não fomos ouvidos.
Neste dia, comunicamos aos planos de
saúde que a partir de 1º de agosto inicia-
ríamos o descredenciamento dos pedia-
tras doDistrito Federal. Como não houve
qualquer pronunciamento por parte de
seus gestores, a categoria tornou-se ainda
mais unida em seus propósitos, sendo
esta a nossa maior vitória. Desde então,
quase 100% dos pediatras vêm exercen-
do a profissão de forma liberal e autôno-
ma. Não hámais atendimento a planos de
convênios. Opaciente, ao pagar a quantia
reivindicada pelo movimento para o seu
atendimento recebe nota fiscal ou recibo
e busca o ressarcimento em sua operado-
ra, sendo este um procedimento garanti-
do publicamente pela ANS e PROCON.
Nas últimas semanas algumas empresas
voltaram a assinar contratos com grupos
sob a fiança da Sociedade de Pediatria
com valores de consulta entre R$ 75,00 e
R$ 88,00 e respeitando os demais pontos
da nossa pauta da reivindicação. O mais
importante é que nossas reivindicações
foram compreendidas pela ANS como
uma mudança de paradigma no rela-
cionamento com a saúde suplementar e
estes ganhos serão estendidos a todos os
setores da pediatria do País.