E
u tenho tantos amigos que perco a conta. Di-
zem que os verdadeiros amigos são poucos, não
sei. Exageram; acabam esquecendo dos seus
próprios irmãos.
São pessoas que nunca me emprestaram um tos-
tão sequer, nem me fizeram pedidos ou favores absur-
dos, mas, um dia, quando eu mais precisei de apoio,
me deram uma palavra de conforto, um forte abraço
fraterno. Quando me viam, logo sorriam. Quando es-
tive feliz, curiosos, queriam saber o motivo; quando
estive triste e chorei, me consolaram; quando sumi,
sentiram a minha falta e se preocuparam, ligaram-
-me, mandaram-me uma tocante mensagem ou um
❤
fraterno, dizendo: “Por onde estiveste?”. Quando obti-
ve conquistas, vibraram muito comigo. Quando pen-
sei que estivesse ficando louco, me ajudaram a pensar.
Quando perdi a batalha, disseram-me: “Levante a ca-
beça e siga adiante”. Quando me senti derrotado, dis-
seram: “Estou a teu lado para o que der e vier”. Quan-
do estive cheio de dúvidas, me esclareceram; quando
tive medo, me fortaleceram; quando estive enfermo,
me visitaram; quando estive perdido, me resgataram,
e quando fiquei desorientado, foram verdadeiras bús-
solas na minha vida; mas, olha, quando fiz besteiras,
me aconselharam muito e até me xingaram; me abor-
recia e me cansava de suas falas, mas, quer saber, no
fundo, eu merecia ouvir mesmo aquilo e os agradecia
muito pelos conselhos e até broncas. Portanto, nunca
me abandonaram. Sempre tive um ombro amigo. As-
sim, cresci acostumando-me com eles, necessitado de-
les, e quando fico algum tempo sem vê-los ou sem saber
por onde estão, pareço deslocado, e a vida vai perden-
do a graça. Talvez isso seja o significado da passagem
do tempo. As suas existências são como um discreto,
mas permanente porto seguro. Longe deles, sou uma
árvore desfolhada no inverno; próximos de mim, me
fazem sentir viçoso como um campo verdejante após
a chuva, repleto de canto de pássaros.
Paulo Rebelo
Cardiologia
Macapá – AP
Crônica
Amigo