LUIZ HENRIQUE
MANDETTA
Luiz HenriqueMandetta formou-se emmedicina em1989 pela Universidade Gama Filho do Rio de Janeiro/RJ
e, dois anos depois, concluiu a pós-graduação emOrtopedia pela Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul (UFMS), onde também foi professor do curso de pós-graduação. Assumiu a presidência da Unimed
em 2001 e, em 2005, foi empossado secretário municipal de Saúde Pública da Prefeitura de Campo Grande.
Hoje deputado federal pelo DEM-MS, eleito em 2010, concedeu a seguinte entrevista ao
Jamb
.
Qual a sua avaliação do acordo entre Brasil e
Cuba para a importação demédicos?
Ele nada diz sobre a forma de remuneração dos
cubanos, a não ser que aOrganizaçãoPanamericana
de Saúde (OPAS) cobrará 5%do valor inicial
de R$ 510milhões pela intermediação...
LuizHenrique –
Esse acordo é pornográfico. AOPAS serve
como um navio negreiro e o ministro da Saúde, como o
senhor dos escravos. É impensável, em pleno século XXI,
termos que discutir uma manobra tão baixa, tão medíocre,
tão cruel com seres humanos. O Brasil jamais será um país
de primeiro mundo tratando seus trabalhadores de maneira
tão desumana. Ficaremos sempre com a impressão de
que a OPAS nada mais fez do que se passar por um elo de
corrupção para que este nosso governo corrompa outros. É
lamentável que uma entidade que já teve um papel importante
se preste hoje a um trabalho tão mesquinho e tão pequeno.
Osenhor entende que os cubanos também
são vítimas nesse processo?
LuizHenrique –
Sim, os trabalhadores de Cuba são tão
vítimas quanto nós – acho que da mesma forma que os que
foram explorados pela escravidão no Brasil, quando os navios
negreiros passavam pela África, negociavam e pagavam pelos
escravos nas tribos africanas e depois lotavam os porões
dos navios. Quando chegavam ao cais do Valongo, no Rio
de Janeiro, os mercadores vendiam essas pessoas. Ao que se
assiste hoje é o Brasil negociar com umEstado o trabalho de
pessoas, retendo documentos, retendo famílias e utilizando-
-se da OPAS como um navio negreiro do século XXI para
trazer trabalhadores que não gozam dos seus plenos direitos
individuais de liberdade, livre expressão, ir e vir, receber
seus salários integralmente e conviver com suas famílias.
Qual seria a solução para evitar essa importação?Uma
carreira de Estado, como propõemas entidadesmédicas?
LuizHenrique –
A solução passa, primeiro, por definir que a
União é responsável. Ela não pode se esconder atrás dos altos
palácios de Brasília, de maquiagem de números, de ministros
e políticos que não querem nada além de se candidatar a
cargos eletivos em outros Estados. Ela não pode achar que
Saúde é uma questão menor. A partir daí, o primeiro passo é
reservar 10% das receitas brutas da União para a Saúde. Isso
seria o piso mínimo. Daí em diante, teríamos de ter recursos
provenientes do pré-sal e de outras cargas como adicionais a
esses 10%. O segundo passo é reorganizar a força de trabalho.
Isso passa, sim, por uma carreira médica de Estado, para que
a pessoa possa, ao fazer um concurso público federal, ir para as
cidades pequenas imune às oscilações de humor de prefeitos
e aos calotes que eles sistematicamente dão nos médicos.
Em paralelo a isso, deve-se fazer o enfrentamento e a
aprovação do piso dos agentes comunitários de saúde e
da enfermagem– ou das 30 horas da enfermagem–, a
inserção do profissional de educação física – porque o
esporte é, sim, saúde – e, finalmente, há que se fazer o
reconhecimento da força de trabalho dentro do SUS e
remunerá-la dignamente. A PEC 454 é um primeiro
passo para resgatar, via legislativo, o caminho que as
ruas já nos pediram: que se fixe o médico através de um
concurso público que seja digno desse profissional.
Oque achou da decisão doCongresso de referendar
os vetos da presidenteDilma à Lei doAtoMédico?
Luiz Henrique –
Não foi surpresa. O governo, através do
voto secreto, trabalhou contra o Ato Médico da mesma
maneira que trabalhou contra a revisão do Fundo de
Participação dos Estados. Ele utilizou-se dos velhos
instrumentos de barganha que diminuem o Congresso
Nacional, mas que infelizmente ainda dão resultado, como
nesse caso da lastimável posição do governo no Congresso
Nacional, numa lei que tinha sido referendada por todas
as outras categorias. Eles promoveram uma divisão
artificial do setor da Saúde, capitalizaram politicamente,
envolveram a discussão pequena em um tema muito
maior. Fica de legado para as próximas gerações que
governos que falam uma coisa no palanque e fazem
outra à luz do dia não são confiáveis e são marcados pela
mentira e pelo que há de pior na vida pública. Que sirva
de exemplo para as futuras gerações, para que aprendam
a separar o joio do trigo e deixem de ser presas tão fáceis
dos manipuladores dos movimentos estudantis, dos
movimentos populares e dos movimentos sociais.
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Arquivo pessoal
Setembro/Outubro
2013 •
JAMB
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