JAMB Cultura 2015; 5-6(35/36):273-280
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Conto
Que lugar é esse?
Os olhos do menino cintilavam de emoção. Na sua ida-
de (10 anos, se tanto), já tinha uma avidez pelo conhe-
cimento, e tudo que passava a sua frente era registrado
e decodificado. Se não conseguisse essa proeza, tenta-
va desvendar o mistério. Procurava ler a respeito (mes-
mo com a idade ainda tenra, já tinha interesse pela lei-
tura) ou perguntava aos adultos que o rodeavam. Sua
família, proveniente do interior, tinha, no número de
filhos, o diferencial. Seus pais tinham uma dezena de
filhos, de diversas idades, interesses e conhecimentos.
E o menino procurava o seu lugar, adquirindo o conhe-
cimento que lhe caísse nas mãos ou lhe penetrasse pe-
los ouvidos ou pelos olhos.
Os passeios habituais da família, aos domingos, res-
tringiam-se a banhos de mar na praia de Boa Viagem
(posto 6) e ao aeroporto do Ibura, para assistir a pou-
sos e decolagens de aviões. Remodelado, o aeroporto
recebeu outro nome: Aeroporto Internacional do Reci-
fe/Guararapes. Ajardinado, com três áreas de acesso ao
público para acompanhar o movimento dos aviões, era
um dos passeios preferidos de famílias e de namorados,
que preferiam o mirante do segundo andar, com
seu caramanchão.
Tudo era novo aos olhos do menino: os
aviões Convair da Pan Air, os Super Conste-
lation da Real Aerovias. Todos enchiam de
beleza os seus olhos curiosos. Mas uma coi-
sa logo o intrigou: onde fica o
smoking
? Pro-
curou na memória alguma referência, mas
só lhe veio aquele traje que seus irmãos mais
velhos usavam, alugados na alfaiataria e tintura-
ria Papaléo para festas de formatura, que, na época, exi-
giam traje de gala. Mas era uma roupa e não um lugar.
Sua curiosidade o aguçou mais: onde ficava esse tal
de
smoking
?
Não se conteve e fez a pergunta ao irmão mais velho
que, naquele dia, o acompanhava no passeio.
– Onde fica o
smoking
?
O irmão, surpreso com a pergunta, não soube respon-
der. Mas não ficou na resposta negativa, ávido que era,
também, por mais conhecimento. E lhe devolveu a per-
gunta para obter alguma pista que o conduzisse à res-
posta tão ansiosamente esperada.
– Ora, por que você está fazendo essa pergunta? Não
sei onde fica esse
smoking
.
E ele não o fez esperar. Levando o irmão pelo jardim
térreo do aeroporto, aproximou-se o quanto pôde da pis-
ta de manobras dos aviões. E, ali, estava a origem da tão
intrigante pergunta.
Junto à pista de acesso, bem visível, estava uma pla-
ca de advertência:
É PROIBIDO FUMAR
NO SMOKING
Paulo Camelo
Patologia clínica
Recife – PE